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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

O Campo e a Cidade - ou - As Pessoas - Karpe Diem

..ou ainda "Como se a pressa fosse urgente..." - Karpe Diem
.

Instituiu-se em tempos que na Cidade se tem uma melhor vida, se vive melhor porque há mais oportunidades, onde há mais e melhor evolução, modernização e educação e outras palavras a acabar em ão, mas não todas claramente, mas damos por nós sozinhos no meio da multidão, é o que é.

Treinar na Cidade é passar por 100 corredores e apenas meia dúzia deles (com sorte!) te responderem ao teu "Bom dia", para o caso de tomares a iniciativa de o dares.

No Campo, as coisas são diferentes. Passas por 10 corredores e 9 respondem ao teu cumprimento.

Mas eu vivo no meio termo. Cidade a cheirar a Campo. Campo a cheirar a Cidade. E as pessoas, ai as pessoas são um bicho interessantíssimo para se observar e neste meio Cidade, meio Campo há uma certa confusão social e as tais, as pessoas, não sabem bem como se comportar.

E hoje, ao longo de 18 ,120 Km corridos em 1h50m, pelo "Campo", talvez tenha encontrado os tais 10 corredores e desses dez, nove responderam ao cumprimento, por voz ou por gesto para o caso dos que iam muito ofegantes, mas um deles, que por caso era mulher deu-me a inspiração total para este texto.

"Passou por ela em sentido contrário, ambas em passo lento de corrida. Os olhos desta batem nos daquela e genuina e naturalmente esta atira com um "Bom dia" ao que a outra responde com um grunhido, um som grotesco entre dentes. Fantástico, pensa esta. E sorri. E segue. Volta e mais volta e eis que o caminho destas duas se cruza de novo. Desta vez, esta, não disse nada. Calada, seguiu e nem sorriu ou acenou, como por hábito faz. Desta vez, continuou apenas a ouvir a vento e seguiu ao ritmo do seu coração. Escusado será dizer que deve ter sido um descanso para a outra! Somos umas bestas, é o que é. É triste mas é verdade. E se não tivermos cuidado, ficamos como estas pessoas, porque afinal nós, também somos pessoas.

"As Pessoas"

As pessoas são agressivas
Apressadas e fechadas
Alugaram por uns dias
Uma vida com assoalhadas

As pessoas morrem de tédio
Avançam sem dormir
Nos olhos pobres diabos
Sôfregas no aperto do tempo

As pessoas sobem, as pessoas trepam, as pessoas pulam
As pessoas sobem, as pessoas trepam, as pessoas pulam

.../...


As pessoas morrem de tédio
Avançam sem dormir
Nas margens da loucura
Como se a pressa fosse urgente

.../...

Como se a pressa fosse urgente, Como se a pressa fosse urgente
É como se a pressa fosse urgente
Como se a pressa fosse urgente, Como se a pressa fosse urgente

As pessoas sobem, trepam e pulam, fingem pacatamente
Tugem pelas margens da loucura
Como se a pressa fosse urgente"

Letra: António Manuel Ribeiro
Música: Karpe Diem





quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Como as pessoas

Os blogues são como as pessoas. Nascem e vivem! Respiram, são activos ou passivos, vivem fases melhores e piores. Como as pessoas. São amados, odiados ou vistos com indiferença, totalmente despercebidos aos olhos de alguns. Têm sucesso e são vulgares. E até podem ser ambas as coisas em simultâneo. Como as pessoas. São interessantes, engraçados, animados ou tristes, verdadeiros ou falsos. Tal qual como as pessoas. São necessários ou perfeitamente dispensáveis. Úteis ou inúteis. Dão gosto acompanhar ou pelo contrário são fastidiosos. Totalmente inovadores ou banais e comuns. Tal qual como as pessoas. E tal qual como as pessoas um dia morrem.


domingo, 24 de novembro de 2013

VIII Grande Prémio da Arrábida

Voltei lá mais uma vez, corri e adorei! Foi o VIII Grande Prémio da Arrábida.

12,710 km - Corridos em 1h14m41s

Esta prova é "daquelas". Que vou sempre que possa. Que recomendo. Que gosto. Onde me sinto muito bem. Onde a Organização é 5 estrelas e nos faz querer voltar. E eu volto. Sendo esta a 8ª edição, não sei a quantas fui, desorganizada como sou, mas sei que é prova de top nas minhas preferências.

A noite tinha sido fria. Tinha pago EUR 13,50 para participar e a tentação de ficar no quentinho da cama quando o despertador tocou pelas 7 da manhã não foi suficientemente forte. Não tanto pelo valor pago, que verdade seja dita me custou a dar (não que a prova não mereça, até porque uma percentagem do valor reverte a favor da “Causa Solidária Mário Piteira”, cujo
objectivo é a aquisição de uma cadeira de rodas para o Desporto Adaptado, mas pelas circunstâncias da vida neste momento) mas sim pela experiência que iria perder e essa depois de perdida, nada a recupera como bem sabemos porque a Vida está sempre a passar, sempre a contar, sem dó nem piedade nem tempo para ensaios ou "espera aí que eu já lá vou".

Por isso, lá me meti a caminho e pelas 9 da manhã lá estava em Setúbal, no Jardim de Vanicelos, local da Partida e da Chegada.

Entrega de dorsais rápida e eficiente. Animaçâo antes da Partida. Bom espaço para aquecer. Bom número de participantes.

Esta prova tem a particularidade de se tentar correr em pelotão até ao Km 1, sendo a prova encabeçada até ao 1ºkm por duas Lebres, membros da Organização, Lebres do Sado, que mantêm um ritmo mais suave mas que para atletas(?) como eu nem se nota, pois depressa ficamos para a cauda do pelotão, mas isso não tem importância nenhuma.

O percurso está devidamente assinalado, seguro (sem trânsito), tem 2 postos de abastecimento de água, decorre em alcatrão e terra batida e sentimos que somos acompanhados a prova toda.

A ideia é sair de Setúbal, subir até Palmela (e que subida! Estrada de terra que serpenteia e que eu este ano consegui fazer todinha em passo de Corrida - lenta, claro, mas Corrida! - e estou tão feliz também por isso!! As coisas que nos dão Felicidade são fantásticas não são?!), alcançar Palmela, conquistar Palmela, gosto destes termos e depois apanhar de novo o alcatrão em ligeira descida para depois enveredar de novo por terra batida numa descida acentuada onde sempre perco posições pois continuo a ser uma medricas nas descidas e esta até nem é nada de especial, confesso, e assim que se termina para de novo apanhar terreno plano temos o ponto alto desta prova: um autêntico banquete de biscoitos e Moscatel da terra, que dispenso em prova, mas não mais tarde, delicioso néctar do qual nos oferecem uma garrafa no final, e é nessa parte do percurso que tenho mais um momento de alegria!

As Lebres são Amigos que conheço! Fazem-me literalmente uma festa! Puxaram-me para eles, puseram-me o copo na mão e tiramos uma foto. Insistiram nos biscoitos que eu delicadamente rejeitei assim como o Moscatel - peguei no copo mas foi mesmo só para a foto! E senti-me bem! Feliz! Obrigada Lebres, também por este momento.

Por esta altura, um atleta apanha-me (não foi difícil na descida face ao meu passinho atrofiado) e perante "a festa" pergunta-me: "também fazes parte da Organização, das Lebres? Ou és só conhecida?"

Ao que respondo "Eu? Não...sou "só" conhecida!" e transbordo sorrisos para quem souber captar e continuamos juntos a correr até à Meta. Agora, sem dificuldades de maior, aperto o que posso e vou bem! E a dois vai-se melhor. Entreajuda, em passos similares, ora puxa um ora puxa o outro.  Ganhámos algumas posições e aproximamo-nos da Meta.

O meu pai. Lá está ele! Feliz, feliz, feliz, é assim que me sinto nesse momento! E a Vida é feita de momentos!

Cortámos a meta e despedimo-nos até uma próxima, agradecendo mutuamente a ajuda que naturalmente déramos um ao outro.

Na Meta, temos água, a tal garrafa de Moscatel e t-shirt técnica.

Temos espaço para alongar, repousar e descansar. O tempo ajudou, a relva também e para o ano quero lá voltar!

Obrigada por tudo LEBRES DO SADO, e muitos Parabéns por mais um Grande Prémio realizado com sucesso! Porque sucesso é as pessoas serem felizes e eu (e mais uns tantos) fomos muitos felizes nesta manhã que nos proporcionaram!

Até para o ano, por certo!






















Fotos, pelo meu pai, António Melro, na AMMA - Atletismo Magazine Modalidades Amadoras, aqui

Fotos, pela Organização, num excelente trabalho de Mário Coelho, aqui

sábado, 23 de novembro de 2013

Faz a Vida acontecer

A recordar a chegada à Meta da Maratona do Porto, a 3 de Novembro de 2013:


Já passaram 20 dias desde esse dia. Cheguei "bem" mas cansada. Sofri um bocado mas o prazer foi sobejamente maior e só assim vale a pena! E sou da opinião que 21 dias são o tempo de recuperação de uma Maratona...por isso meus amigos, estou já prontinha para começar a preparar a próxima. Daqui a 13 semanas. Onde, onde? Não é difícil adivinhar, pois claro que não.

Grandes planos, pequenos planos, grandes aspirações, pequenas aspirações, marcas, tempos... muita motivação, pouca motivação, chuva e frio e dias curtos, altos e baixos, já me conheço. Só tenho de lidar com isso. Como sei, como posso, como me for possível e como conseguir. Porque de uma coisa eu tenho certeza: quero daqui a 13 semanas estar a horas de cortar a meta daquela que será a minha 6ª Maratona!

"Faz a Vida Acontecer!" - disse-lhe.
"Faço sim!" - respondeu ela e seguiu sorridente.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Apaixonada...outra vez

...porque há Vida em mim!

Quis fazer a minha 5ª Maratona e fiz! Com o meu pior tempo de sempre na distância (4h42m), cortar a Meta soube-me pela Vida!

A 5ª Maratona está feita! E agora? E agora?

Agora estou de novo apaixonada, amor renovado e reforçado.

E agora?



"...Acorda, Acorda! Não deixes passar a hora! Aproveita! Ainda estás Vivo!"




   "...ao correr os 42 Km da Maratona lembra-te que os primeiros 30 são baseados no teu treino, mas os últimos 12 são corridos com o coração..."

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

"10ª Maratona do Porto" ou "Sou outra vez Maratonista no activo!"

 


10ª Maratona do Porto

O antes

Há um ano atrás, precisamente na Feira da 9º Maratona do Porto, resolvi inscrever-me na edição de 2013, a que seria a 10ª edição. Não especialmente porque o valor da inscrição nessa altura era de "apenas" EUR 17,50, mas principalmente porque me decidira que seria 2013 o ano da desforra. Tinha 4 Maratonas corridas e a que seria a 5ª andava-me atravessada ou não tivesse eu tentado em 2007 (também no Porto) e ter-me visto obrigada a desistir ao km 30. Daí para cá nunca mais tentara. Nunca mais me atrevera sequer a tentar. Dizia que sim, que agora é que era em animadas conversas entre amigos, mas os meses passavam e os anos também e a intenção não passava de palavras a roçar a fanfarronice.

Então, em Novembro de 2012, para além das palavras e das boas intenções, havia um papel assinado e carimbado, um valor pago, uma intenção séria de concretizar o sonho e apagar a nódoa, matar e enterrar o fantasma de uma vez por todas.

O ano avançou porque o tempo não pára e eu deixei-o correr. Sempre com a mesma irregularidade nos treinos, desequilíbrios alimentares, oscilações de peso assim como de ânimo e motivação.

Assim chego ao Verão 2013 e a história parecia vir-se a repetir. Comia, bebia, corria (de vez em quando) e de regularidade e disciplina nos treinos...nada!

Mas a decisão é tomada! Inicio o Verão com um bom plano de treinos. Eu queria correr esta Maratona! O plano era bom porque era meu. Feito à minha medida, ajustado à minha pessoa e às minhas circunstâncias de vida, incluindo horários, tarefas e afazeres e também aos gostos e própria personalidade.

Comecei bem para me espalhar depressa. O plano estava nas urtigas e muitas foram as vezes que pensei mandar tudo para aquele sítio. Alturas em que pensava que não valia a pena, que afinal correr a minha 5ª Maratona não tinha significado nenhum. Que não valia o esforço, afinal seria só uma Corrida e em nada alteraria a minha vida quer eu a corresse, quer não a corresse. Puro engano de quem tenta justificar comodismo e inércia. Justificar passividade e inactividade. Justificar a desistência das coisas de que gosta, que o fazem sentir bem, que o fazem sentir vivo. Justificar o injustificável: a desistência de si próprio...

Várias vezes peguei e larguei. A preparação foi muito irregular, por vezes bastante sofrida mas chegada ao fim, vejo que o caminho que percorri, apesar de não ser uma linha contínua nem recta e uniforme como se desejaria, acabou por me dar a confiança suficiente para me fazer acreditar que seria possível. Assim, chego à véspera da Maratona dia 2 de Novembro de 2013 e estou tão feliz quanto assustada, pois se por um lado me sentia satisfeita por apesar de tudo não ter desistido no caminho (da preparação) e ter chegado aqui com a capacidade física que julgava minimamente necessária para terminar os 42,195 metros, por outro lado os medos ainda eram muitos, e a lembrança fresca do treino mais longo que fizera nesta preparação (31 Km) em que acabei quase a morrer e do qual levei dias a recuperar, não me deixava descansar o espírito.

Fosse como fosse, sabia que as minhas possibilidades físicas de acabar a Maratona com mais prazer que dor (e só assim considero que valha a pena) ou ter de desistir durante a prova eram de 50% para cada lado. Teria de me valer da mente portanto. E essa foi bastante treinada e estava em boa forma para enfrentar o desafio.

Sábado, 2 de Novembro de 2013 - a véspera:

Para ajudar ao doce nervoso miudinho que antecede a Maratona, eu coordeno e organizo a ida e volta de atletas à Maratona do Porto, a partir de Lisboa, em autocarros disponibilizados pela RUNPORTO.
Este ano movimentamos 154 pessoas entre Lisboa e Porto (3 autocarros) pela módica quantia de EUR 10,00 por pessoa (valor estipulado pela organização) e dessas 154 pessoas, precisamente 100 eram Maratonistas (inscritos na Maratona), sendo os restantes participantes na Family Race, na Caminhada e apenas acompanhantes. É uma actividade que me dá trabalho e algumas dores de cabeça, mas que me dá também um imenso prazer. Porque o director da prova, Jorge Teixeira, de quem sou amiga,  assim como a  Runporto e a Maratona do Porto me merecem isso e muito mais e também porque os atletas merecem. Faço-o por amizade e consideração e também uma boa dose de amor à Corrida e especialmente à Maratona do Porto.

Saímos de Lisboa de manhã cedo e a viagem fez-se dentro do previsto. É engraçado ouvir as conversas nestes autocarros. As histórias, os sonhos, as expectativas, os medos. Gosto de pessoas. Ouvi-las. E também por organizar esta excursão, por vezes me são confidenciadas algumas intimidades, que cada vez mais me fazem pensar: quando vemos estes amigos a correr....nem imaginamos o mundo de cada um, o que os move, as barreiras que vencem para estar ali, tão só a correr. E é tão fácil fazer julgamentos fúteis...Já quase os deixei de fazer. Cada vez mais me calo porque nós não sabemos nada...

Chegámos ao Porto, Edifício da Alfândega, onde estava instalada a Feira da Maratona. E parar 3 autocarros naquela via e descarregar 154 pessoas e voltar a apanhá-as 2 horas e meia depois, é uma aventura e uma prova de fogo aos nervos dos mais corajosos. Prova essa que uma vez mais superei.

Foram levantados dorsais e o kit de participante, comeu-se a massa, recebi o livro "Porto a Correr - 20 anos depois" de Luís Lopes, directamente das mãos do Jorge Teixeira e por este autografado, principal responsável pelo que a Corrida é hoje no Porto e em Portugal e já era tempo de retomar os autocarros e levar toda a gente para a Rotunda da Boavista.

Chovia copiosamente quando lá chegamos. Deixar sair as pessoas. Verificar que nada fica esquecido nos autocarros (ainda assim ficou...fiquei a saber mais tarde, (precisamente um dorsal para a Maratona) e outros objectos de menor importância e tudo teve de se resolver. Senti-me na história do Peter Pan e os Meninos perdidos, tendo em conta o número de chamadas que recebi neste fim-de-semana: de alguém que precisava de saber algo, que pedia algo, que informava algo... Escusado será dizer que o Peter Pan era eu...e tinha 153 meninos perdidos nesta história... Mas o Peter Pan é feliz assim, a fazer pelos outros o que gosta que façam por ele, por isso, também por isso, o Peter Pan foi muito feliz neste fim-de-semana.

Já no hotel, decidiu aproveitar a piscina e esteve lá uma hora a nadar, devagarinho mas a nadar, e depois foi fazer uns minutinhos de sauna. Tudo o que ela não está habituada e portanto está-se mesmo a ver que ela fez tudo o que seria mais recomendado para a véspera da Maratona! Ao jantar, mais massa e foi dormir a sonhar que corria a sua 5ª Maratona.





O dia da Maratona, 3 de Novembro de 2013:

6:00hrs - toca o despertador.
Acordar a minha malta. O pequeno almoço é a partir das 6:30hrs. Estou nervosa, ansiosa e muito feliz. Hoje vou corrê-la! Desta vez, vou corrê-la! "Só" por isso, por me ter preparado o mínimo dos mínimos para me atrever a alinhar na Partida da prova rainha, só por isso, por ter chegado aqui, já me sinto feliz! E nervosa! E ansiosa! E nervosa! E ansiosa! Como o meu habitual pão integral, requeijão e fiambre, café com leite e fruta.

Levo no bolso duas embalagens de gel energético, pois poderá ser preciso, mas acabei por só ingerir uma, pois os abastecimentos estavam perfeitamente bem: água, bebida isotónica em copo, passas, laranja e banana e ainda cubos de marmelada.

Vamos de autocarro até à Partida, onde camiões funcionam como guarda-roupa para nos levarem a nossa roupa para a chegada. Há café e chá à discrição para todos. O tempo está excelente, nada a ver com a chuvada da véspera. Encontro-me entre amigos. Muitos. Bons. Fora os que só estão comigo em pensamento. Tantos! Tantos!

Distribuem-se beijos e abraços e sorrisos. Encontros e reencontros. Estou tão feliz! Eu hoje estou aqui, deste lado. Eu hoje vou Corrê-la! Ninguém imagina o que sinto, ou talvez o transborde e seja visível aos outros. A alegria misturada com o nervosismo.

Depressa estamos alinhados na Partida. Amigos insistiram para que entrasse na zona da Partida Vip. Facilmente tive acesso. Não que goste muito nem que me seja muito vantajoso. Não gosto de estorvar. Não gosto de involuntariamente começar num ritmo mais forte que o meu porque insconscientemente seguimos o andamento e o andamento por ali é rápido, muito rápido. Não gosto de ser ultrapassada por milhares de pessoas. É mau a nível psicológico! Não gosto! A vantagem de ter partido dali foi estar entre amigos que por ali estavam e as casas de banho: sem fila e certamente menos sujas. Ah, e também apareci na televisão, num flash, quando a SIC por ali andou a captar imagens. Se é que isso possa ser considerado vantagem (que não o é).

Estamos agora alinhados, juntos, à espera do tiro de partida. Nervosa. Ao meu lado o João que com menos treinos que eu, me prometia levar à meta, nem que fosse ao colo. Mas eu nestas coisas, se ter companhia pode ser muito bom, eu gosto sempre de fazer o que posso. Compromissos nas Corridas pouquíssimas vezes os tive (e honrei-os) mas numa Maratona então, nem pensar! A prova é muito longa, muita coisa pode acontecer e cada um deve respeitar o seu corpo, ouvir-se, estar atento a si e ir no andamento de outro, tanto pode prejudicar-se a si próprio como ao outro muitas vezes. Um abranda, o outro dá mais para não atrasar o outro e acaba por rebentar, por isso, compromissos desses não gosto. Aprecio companhia nas provas, mas desde que, e só se, o andamento for naturalmente o mesmo. De outra forma, amigos amigos, Corridas à parte. Porque afinal estamos numa Corrida, não numa questão de vida ou de morte e deixar um amigo para trás não tem nada a ver com falta de companheirismo ou entreajuda. Para isso tenho a vida inteira e o dia a dia. Ali, estou para correr. Porque se o meu principal objectivo fosse principalmente conviver, ia para a cervejaria comer um prato de caracóis e beber cerveja com os amigos.

Ao lado do João está o Fernando e ao lado do Fernando está o Mário. A música torna o momento ainda mais solene. Passa-me a vida inteira pela cabeça. Apertamos as mãos entre nós num desejo de boa prova. Arrepio-me. As emoções vêm já a cavalgar dentro de mim e formam um nó na garganta que se desfaz de seguida. Estou pronta. O tiro é dado e a alegria explode em forma de passos de Corrida. O coração bate e começamos a subir. O meu pai está quase no cimo da subida e vê-me. Bom, sabê-lo ali. Estão comigo dezenas de amigos. Levo-os no coração. Os que me desejam bem. Os que me estimam, me consideram, os que posso chamar de amigos. E são muitos.

O Fernando e o Mário desaparecem. O andamento deles é de outro campeonato. Fico com o João. Estamos já na Rotunda da Boavista. O ritmo é lento mas não para mim. Aviso o João, que estamos mais rápidos do que eu deveria pelo menos. Tranquiliza-me que iremos estabilizar. Estádio do Bessa, a magnífica Pantera Negra a mirar-nos. Abrandamos mas pouco. Vou sempre a travar, não quero ir a 5:30 como este último quilómetro! Sim, é a descer, eu sei, mas é muito rápido. Mas estou bem, é verdade. Mas também já sei o que é irmos "bem"(?) a um ritmo mais forte que o que sabemos adequado a nós e à distância e depois rebentar lá para o km 20 e muitos ou 30... e penar até à meta. O João é uma excelente companhia. Seguimos juntos. O seu amigo Bráulio corre a Maratona de máquina fotográfica em punho e surpreende-nos várias vezes, ora em cima de um muro, ora agarrado a um poste. Magnífica disposição e magnífica forma para correr assim 42 Km. O resultado está aqui:


Castelo do Queijo. Virámos para Matosinhos. Os meus amigos comigo. A minha família comigo. A minha vida inteira comigo. Sigo com o João. Feliz e segura. Também cautelosa mas firme. Retorno e de novo Castelo do Queijo. Agora a Foz. Lindo o mar, lindo o dia, lindo o Porto, lindo o céu, linda a vida. De novo, emoções a fervilhar, a levantarem-se das entranhas e a aflorarem à pele. Arrepios sob o sol quente. Emoção. Coração nas mãos. Corro, com o João. Vamos bem.

Agora descemos para a Ribeira. Os meus joelhos queixam-se mas eu adorei especialmente esta parte. Os vendedores, as tascas, o Douro ali tão perto, a vendedeira que corre eufórica para bater  mão com mão no João que corre já em tronco nu e faz furor à sua passagem (o adesivo protector dos mamilos descolara-se e continuar a correr com a camisola vestida faria sangrar).

A ponte D.Luís sob os nossos pés agora. Gaia. O Douro agora a oferecer-nos a margem esquerda. De Gaia à Afurada. Os pescadores sisudos. A roupa a secar ao vento, os barcos típicos do Douro, o sol, a vida. Corro.

O retorno. Vamos bem. O João quebra. Sinto-me aliviada. Soube-me bem abrandar também. É tudo mecânico, mas agora corro eu ligeiramente à frente dele, embora lado a lado. Vamos bem. Já temos mais de Meia feita. Ele refere que a partir de agora (km 22) já está a correr mais que no seu treino mais longo desta preparação. Vamos devagar, vamos bem. Começamos a ser passados. Não importa. Ele manda-me para a frente. Sinto nitidamente que estou melhor que ele, mas tenho medo. É cedo, respondo. Tenho medo. E ele manda-me para a frente. E eu respondo é cedo, tenho medo. E vamos nisto sensivelmente até ao km 27...ou 28 (uma conversa interessante como se vê). Mas o João vai com alguma dificuldade, ouço-o respirar em desconforto, e eu sinto-me bem e ele impele-me mais uma vez para eu ir para a frente. E eu vou. Perco o medo, mas não todo e sigo por minha conta. O João vai bem, só tem de ir ao seu ritmo. Sigo confiante mas cautelosa. Os abastecimentos são bons. Já tomei o meu gel, e em todos os postos tomo água, bebida isotónica e mordo laranja. E sigo. Cada passo dado, um a menos que falta. Um passo vencido, cada vez mais próxima da meta. Sigo sozinha. Penso nos que me desejam bem. Nos que não podem aqui estar e torcem por mim: Marcelo, Pinho, Jorge (a quem dediquei o último km sempre a correr)...

Sinto-me uma sortuda por ali estar. Um prémio merecido. Uma conquista para a qual trabalhei. Uma viagem para desfrutar. Um passeio pelo Porto em passo de Corrida. De novo a ponte a ligar as margens. Vamos para a direita agora. O Douro sempre por companhia. As placas a marcar os quilómetros não batem nada certo com o meu GPS... mas isso é um pormenor. Eu só tenho de chegar à Meta. Retorno e lá à frente o túnel. O GPS perde o sinal e retoma-o o que me baralha ainda mais. As placas estão "atrasadas" em relação ao meu GPS... houve já em mim uma quebra de ritmo. Não um muro, não uma marreta, mas uma exaustão que se foi instalando devagarinho, continuamente e eu a dar por isso. Caminho. Retomo o passo de Corrida. Já estamos no Km 36...37...caminho e corro. É possível! Acredito já sem grandes dúvidas. Estou bem. Passam-me. Sou passada. Uma moça que estava a assistir, ao ver-me enche-se de alegria e ouço-a: "Ai...olha....é a Ana, eu à Ana tenho de tirar!" Fotografa-me e dirige-se a mim. Estou suada e ela abraça-me e dá-me um beijo. Não a reconheço logo... mas retribuo extremamente emocionada. É a Elisabete, só pode ser a Elisabete, de Amarante! Penso já depois de a deixar no meu passinho lento e arrastado de Corrida. Como me soube bem aquele momento. Sigo alternando Corrida e caminhada. Até que chego outra vez ao Castelo do Queijo e é altura de virar à direita para começar a subir a Av. Boavista em direcção à Meta. Nesse ponto, há animadores que puxam por nós, nos incentivam, nos chamam pelo nome (temos o nome no dorsal) e nos empurram para cima, para a recta final de quase 2 Km! E a Ana, ali ganhou forças. Mentaliza-se que falta pouco, agora falta pouco e pensa no pai e nas meninas que estarão à sua espera. Sobe devagarinho. Pensa no Jorge neste último Km, pensa no João que lá virá atrás, pensa em tudo e em todos. A subida parece que suaviza e eis já os portais que antecedem a Meta. Público, fotos, palmas. Vai fora de si. Busca com o olhar o pai e as meninas. Vai-se aproximando da Meta e de repente aterroriza-a a ideia de ter acontecido alguma coisa ao pai ou às meninas. Não os vê. Dentro dela, um misto efervescente de emoções, absolutamente impossível de transmitir por palavras. Mais uns passos em frente, o coração a bater e eis que os avista. Alívio! Nova avalanche de emoções. A garganta aperta-se-lhe e parece que lhe custa a respirar. Lágrimas ameaçam brotar dos olhos mas são contidas. Alegria! Muita alegria. Bate com a mão na mão da filha, sorri, sorri muito e segue para a Meta. Levanta os braços. Olha o céu. Parece que nasceu de novo. Parece que se descobriu de novo. Desliga o cronómetro: 4h42m38s!!! A sua pior marca de sempre. A sua melhor Maratona sem dúvida! E assim que corta a Meta, o Tiago felicita-a, aperta-lhe as mãos juntas e ela desfaz-se num sorriso. Grata. Grata pela Vida e grata pelos amigos! Logo de seguida a Ligia....abre-lhe os braços e abraça-a. E ela suada, babada, ranhosa... e abraça a Ligia e quase chora, de alegria. Parece que eles sabem o que ela sente e o que representa para ela esta Maratona. E sabem! E ela sente-se tão, mas tão elevada. Num patamar qualquer de felicidade desconhecido até hoje. Não pelo que acabou de correr (marcou o seu Garmin 42.770 m) mas pelos amigos que tem. Pelas pessoas que a rodeiam, que lhe querem bem, a estimam e a fizeram sentir-se tão bem neste dia. Sente-se feliz não tanto pela Maratona que correu mas pela vivência que isso lhe proporcionou. Pelas pessoas que se mostraram. Pela amizade que redescobriu e reafirmou. Proporcionou-lhe esta Maratona uma das experiências mais ricas e enriquecedoras que alguma vez teve. Pelas emoções vividas. Pelas pessoas! Pela emoção ao rubro pronta a explodir! Porque nós sozinhos somos nada!

E as pazes com a Maratona estão feitas! E o Amor continua. Cresceu e solidificou. Esta foi a sua 5ª Maratona! Pode dizer agora que tem uma "mão-cheia" de Maratonas. E deseja-se já muito que venha a próxima! E a 11ª edição da Maratona do Porto, dia 2 de Novembro de 2014 essa não lhe escapará por certo!

Ana Pereira


A Maratona sem emoção:

- Prémios de presença (kit), entregue com o dorsal: Camisola de algodão, revistas;
- Prémios à chegada: medalhão, camisola técnica, com modelo de corte feminino para as mulheres e garrafa de Vinho do Porto com logotipo da Maratona;
- Bons abastecimentos: água, bebida isotónica, fruta, passas e marmelada;
- Marcação de km (suspeito de erro) que se reflectiu na distância total: mais que os 42.195 metros de distância oficial da Maratona...
- Excelente organização quer na partida quer na chegada;
- Alguma animação musical ao longo do percurso (bandas a tocar);
- Uma Feira magnífica, com Pasta Party e vários stands;
- Constante presença da Cruz Vermelha e outros meios de socorro ao longo do percurso;
- Percurso bonito e agradável, a pecar pelo piso nalgumas zonas (calçada esburacada e desalinhada);
- Facilidade de transporte de atletas e acompanhantes, por valor baixo (eur 10,00) a partir de uma cidade a 300 km de distância (Lisboa);
- Facilidade de transporte (gratuito) no dia da prova entre a Meta e a Rot. Boavista depois da prova , e de vários pontos da cidade para a Partida, antes da prova;
- Percurso em total segurança em relação ao trânsito, perfeitamente marcado e com algum público;
- A par da Maratona decorreu a Family Race e uma Caminhada;
- Número total de participantes nos 3 eventos: cerca de 10.000 pessoas
- Número de chegados à Meta da Maratona: 2775 atletas cortaram a Meta, estabelecendo assim um novo record de número de atletas chegados à Meta da Maratona em Portugal;
- Massagens à chegada, água e cerveja preta à discrição;


- Esta rapariga já aceita que fazer a Maratona em (muito mais que ) 4 horas tem todo o valor e vale a pena sim! Foi 2463ª classificada entre 2775 chegados à Meta

Recados:

MARCELO!!!! Marca na tua agenda, 2 de Novembro de 2014: 11ª Maratona do Porto!!!

ANTÓNIO PINHO: Quero-o cá para o ano!!!

JOÃO HÉBIL: para o ano...abaixo de 4!!!!

Algumas imagens:

À mesa do pequeno almoço no dia da Maratona:

Já no local da partida, com o pai e muitos amigos:

















A Partida: 







Foto da Elisabete Ribeiro...uma surpresa e um encontro emocionante








Mas ela chega...ou não chega?!




Vêem a minha cara? O que lhes diz?


Descanso dos guerreiros, com Joaquim Adelino: